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http://www.clubedeautores.com.br/book/33715--DICIONARIO_DA_TEORIA_LITERARIA_E_ESTETICA_DE_MONTEIRO_LOBATO





FORMA

1. Ando a remoer uma observação que fiz há tempos e insiste. A forma perfeita é magna pars numa literatura. Não basta a idéia, como a reação contra o romantismo nos fez crer — a nós naturalistas. Há erro em querer que predomine uma ou outra. É mister que venham de braço dado e em perfeito pé de perfectibilidade. Há pelo Norte uns escritores de talento que só querem saber da idéia e deixam a forma p’r’ali. Eu também já pensei assim — que a idéia era tudo e a forma um pedacinho. Mas apesar de pensar assim, não conseguia ler os de belas idéias embrulhadas em panos sujos. Por fim me convenci do meu erro e estou a penitenciar-me. Impossível boa expressão duma idéia se não com ótima forma. Sem limpidez, sem asseio de forma, a idéia vem embaciada, como copo mal lavado. E o pobre leitor vai tropeçando — vai dando topadas na má sintaxe, extraviando-se nas obscuridades e impropriedades. E se é um leitor decente, revolta-se com os relaxamentos à Sílvio Romero, os pequeninos atentados ao pudor da língua — e com todas essas revoltas e extravios e topadas perde o fio da idéia e acaba com a sensação do caótico. Acho a língua uma coisa muito séria, Rangel. Como a nossa mãe mental.
A forma de Sílvio Romero e outros nortistas, Rodolfo Teófilo, Manuel Bonfim, etc., lembra-me uma estrada de rodagem sem pavimentação, toda cheia de buracos e pedras, e difícil de caminhar a cavalo — porque ler é ir o pensamento a cavalo na impressão visual e outras. Machado de Assis me dá a idéia duma estrada de macadame onde o nosso cavalo galopa tão maciamente que nem mais atentamos na estrada. Nos outros não tiramos os olhos da estrada, tais os perigos e a buraqueira — e como há de ver a paisagem marginal quem vai de olhos pregados no chão? O mal português mata a maior idéia, e a boa forma até duma imbecilidade faz um jóia. (1:222-223)
2. A tua descoberta da serventia do vernáculo bem aprimorado como tampão do vazio de idéias, cai na regra de que a Forma salva tudo. Haja Forma, e o leitor, engodado pela beleza exterior, esquece-se de pedir beleza interior (idéia). E assim os patifes da Elegância fazem com meia arte o que a pede inteira. (2:157)
3. Quanto à forma, impossível eximirmos de várias restrições. Se o objetivo de um escritor é transmitir idéias e sensações, essa transmissão será tanto mais perfeita quanto mais respeitar a psicologia média dos leitores. Quando, ao invés disso, arrastado por preocupações de escola, vai contra ela, na vã tentativa de inovar, em vez de causar a impressão visada causa uma impressão defeituosa, incompleta, "empastelada", muito diferente da que pretendeu. Tenha isto em vista o jovem romancista, faça experiências in anima mobile, abandone teorias, escolas, corrilhos, "ache o seu trilho — e sua obra corresponderá na aceitação pública ao muito que se espera do seu magnífico talento. (10:22-23)
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Ver: ESCRITORES: MACHADO DE ASSIS 2 (4:252)