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JORNAL

1. “Pois dê ao jornal o nome de Minarete, sugeri, e no primeiro número explicaremos aos povos o que é minarete – aquelas esguias torres das gentes islâmicas, de cujo topo, ao cair da tarde, os muezins convocam os fies à prece. Um jornal é um minarete de cujo topo o jornalista dá milhos às galinhas da assinatura e venda avulsa. Fica muito bem esse nome – e é nome que não está estragado. Tribunas do povo, por exemplo, existem centenas.” (1:28)
2. O jornal moderno, ao molde americano, é a reportagem sensacional. Mas com este alcalóide estupefaciente se dá o mesmo que com os filmes de estrondo: só está ao alcance das empresas que nadam em ouro. Sem derrame de libra, dólar ou peso, não há colher as preciosas orquídeas da sensação – flores que se não confundem com o escândalo social. (6:61)
3. O jornal é uma casa de pasto, com quitutes de idéias e arranjo de pratos diários com o tempero ao sabor dum paladar que não muda. Freguês do jornal é como freguês de restaurante. Adquire hábitos gastronômicos, sérios e respeitabilíssimos. Se o jornalista, levado pela veneta ou por humores extravagantes perde o ponto de bala, dá sal demais ou mete banha de lata no que requer manteiga, arrisca-se a um “Idiota!” desconcertante e à perda dum facções, gente afim em matéria de exigências mentais, tom, timbre, estilo, temas e até disposição tipográfica.
Agremiam-se lentamente em torno da folha que melhor lhes vai com o diapasão, afazem-se à sua mesmice, e a ela identificam-se. Nada evidencia melhor este fato do que a observação dos leitores dos velhos órgãos. Chegam a abdicar do pensamento próprio, e esperam, para formar opinião, que se manifeste o seu mentor de papel e graxa.
- A peça de ontem? Fui assisti-la, mas não sei se é boa ou má. Inda não li o “jornal”...
Não dizem os jornais. Singularizam, porque opinião decisiva há uma só, a do seu jornal. Os outros...
Daí jornais de todas as cores e feitios – amarelos, rubros, cinzentos: escritos com cordite líquida ou mel rosado; vestidos à última moda capistranescamente; sisudos ou brincalhões; honestos ou canalhas. Diz-me que jornal lês, dir-te-ei que bisca és. (...)
Para conquistar o seu público jogam os jornais com dois elementos: tempo e constância de atitude. Confirma-se aqui o adágio: pedra que muito mexe não cria limo. Sem esta adoção duma cara ou máscara fixa, seja ela qual for, impossível criar o limo que torna o jornal vivedoiro. Se muda de cara duas ou três vezes, está irremediavelmente morto. O público – o limo – afasta-se, murmurando: “Ventoinha!”
Mudar nem para melhora, porque bem ponderado não há melhor nem pior. A verdade não existe, a vida é uma irisação, e tanto está certo Rui como Seabra. Tudo varia com o ponto de vista. O Rio é um para quem o vê na Avenida; é outro olhando da Praia Vermelha; e do alto do Pão, quatrocentos metros apenas acima do mar, não é mais nem um nem outro, e sim um quadro da natureza, uma simples paisagem. Afirmar que o verdadeiro Rio é este ou aquele é de ótima política para o partido em que formamos – mas nada filosófico. Pelo menos é isso o que nos ensina o filosofar da pena, fiel companheira por cujo bico escorre toda a sabedoria humana. E não só a sabedoria como a sandice, o que dá na mesma, pólos que são, sabedoria e sandice, do mesmo mundo, o cérebro. Daí o prognóstico dos jornais. Afirme cada um o que bem saiba ao seu limo, e nada de vôos planados pelo éter da filosofia pura onde mora a Dúvida – certeza única, mas de perigosíssimo uso cá embaixo. Jornal assim, só de filósofos seria entendido, e de mais ninguém. Quer isto dizer que nem um só leitor teria porque os filósofos ignoram a existência dos jornais. E quando apanham um é para dar-lhe emprego muito diverso do visado pelas empresas, chegando até a filosofar sobre o maravilhoso que seria se por acaso pudessem vir em branco. (14:128-131)
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Ver: ESTILO 6 ( 1:312-313 ); 7 (2:6-7 )
OPINIÃO PÚBLICA (7:6)