ADQUIRA ESTE DICIONÁRIO IMPRESSO

Você pode adquirir este dicionário impresso através do seguinte site:

http://www.clubedeautores.com.br/book/33715--DICIONARIO_DA_TEORIA_LITERARIA_E_ESTETICA_DE_MONTEIRO_LOBATO





POETA

1. E então compreendi o que é realmente ser poeta. É ser por natureza um orgânico produtor da indefinível sugestão a que chamamos poesia – sugestão que não visa coisa nenhuma, que não quer provar coisa nenhuma, que é o mínimo possível da terra, tanto foge ao Espaço e o Tempo. Levitação, levitação. (5:116)
2. Poeta... Que surrada andas tu, pobre palavra, e que longe andas do sentido íntimo, pelo abuso de te vestirem quantos por aí medem versos nos dedos para uma periódica postura nas revistas!
Poeta – poeta não é o malabarista engenhoso que acepilha sonetos, embora belos, senão a criatura eleita que ressoa às mais sutis vibrações ambientes, como se toda ela, corpo e alma, fôra uma harpa eólia de cordas vivas.
Os crepúsculos estriados de sangue, o marulho das ondas nos fraguedos, o bisbilho dos córregos nos socavões das matas, a bruma das manhãs, um ninho em que pipilam aves implumes, o silêncio augusto das montanhas, o trilo duma patativa, uma estrelinha a piscar, as vozes misteriosas das coisas balbuciadas em surdina, os cambientes, as penumbras – tudo quanto é estado d’alma da Natureza, esfrola as cordas da harpa feita homem e a faz exsolver-se na gama inteira das vibrações emotivas.
Fixar estas vibrações por meio da palavra disciplinada no ritmo e enlanguecida na melodia da rima, é simples lavor final. O tudo, a coisa suprema, é ser poeta, sensibilidade de galvanômetro, harpa eólia em permanente vibrar a todas as auras.
O homem frio que, senhor da cultura e sabedor da técnica, compõe um poema, por maiores belezas que nele derrame será um retórico, um orador – poeta é que não.
E não, porque seus versos foram compostos ao invés de brotarem lógicos, no incoercível da flor que vem da planta, do perfume que sai da flor, da ebridade que emana do perfume.
O verdadeiro poeta é um eterno soar de cordas que nele são bordões e primas, afinadíssimos, tensos de estalar, e no vulgo são calabrês grossos e bambos.
Alfredo de Musset, Antonio Nobre... poetas no seu tempo, poetas hoje, poetas amanhã, poetas sempre.
Hugo, Rostand... serão poetas para o coração do homem futuro?
Não é retórica a poesia, nem eloqüência. É dor. Dor estilizada, dor de amor, dor de saudades, dor de esperanças, dor de ilusões murchas, dor de anseios vagos, dor de impotência, dor do inexprimível. (16:89-90)